Por Steve Hafler, traduzido com adaptações

Nota do editor: Steve Hafler serviu como um missionário no Kenya e na Zâmbia por 11 anos. Ele agora pastoreia a Igreja Batista Highlands, em Centennial, Colorado. Steve fornece valiosas idéias para as missões atualmente e uma forte dose de cuidado para se manter o foco em Cristo, e somente em Cristo.


Perto do fim de sua vida extraordinária, William Carey estava se transformando em um nome presente nos lares da Inglaterra. As biografias estavam sendo direcionadas para um público mais ansioso. Até mesmo lembranças da vida de Carey eram valorizadas como objetos quase sagrados. Um dia um amigo de Carey estava comentando sobre a fama do "pai das missões modernas". Carey interrompeu-o bruscamente dizendo "quando eu tiver ido, não fale mais do Sr. Carey. Fale do Salvador do Sr. Carey." Carey não era o último missionário a se transformar em uma celebridade, e sua rejeição a tal atenção desviada, sua atitude de "Ele deve ser exaltado; eu devo diminuir" era aliviante. Mas a história inteira destaca uma tendência perigosa no ministério. Quando as missões se tornam centradas no homem, ocorre um desvio na finalidade do ministério que é centrada em Cristo e focada no Evangelho. Este desvio tem origem no antigo ideal biográfico dos anos de 1800 e associado com as atualizações magistralmente preparadas do "Sr. Missionário." Os retratos e as histórias podem apresentar uma visão desvirtuada da realidade no campo, mas quem necessita de fatos quando o povo está obcecado? Feche o negócio e assine o contrato enquanto o povo enxuga as lágrimas de seus olhos e se sinta culpado por viver no conforto do ocidente. Encare o desafio agora! Como você pode não fazê-lo enquanto as fotos estampam imagens de rostos sujos de crianças, de montes de enterros recentes, e a pobreza extrema é refletida sobre você durante o poslúdio de um culto? Qualquer um que não seja tocado pelo que é mostrado tem que ter um coração endurecido, isso é incontestável.

Felizmente, há algumas exceções que amenizam o horizonte do missionário, e elas são identificadas facilmente. Primeiramente, eles não parecem com as duas filhas de Provérbios 30:15, cujos os nomes são "Dá" e "Dá". Em segundo lugar, eles se recusam a se autoelogiar, mesmo inadvertidamente (Provérbios 27:2).

Nós nos tornamos insensíveis à ambição egoísta, construindo impérios, e estratégias pobres porque, bem, é missões. Eu não estou dando simplesmente vazão ao cinismo, embora às vezes eu fique desiludido com as missões ocidentais tradicionais e seu status de celebridade. Mas eu me envergonho de pensar como os crentes que permanecem em suas próprias nações reagiriam se vissem os missionários médios atuais. Nós os apresentaríamos da mesma maneira se eles estivessem vendo? Eles se sentiriam explorados? Eles estão cientes de que suas crianças são os meninos do quadro da pobreza e que as suas histórias são a ilustração de fechamento de nossos sermões? Os crentes locais validariam todas as nossas realizações? Os trabalhos locais foram representados de maneira precisa e justa? Eles concordariam com a impressão dada de que o "Sr. Missionário" é o único que está fazendo o trabalho válido de evangelização no sub-Saara da África desde David Livingstone, mesmo que haja mais de 20 igrejas pastoreadas nacionalmente por pregadores do Evangelho na cidade em que eles vivem? Talvez nós devamos perguntar a esses crentes.

A perspectiva do crente local é reveladora, talvez perturbadora, e se nós formos humildes, útil. Isto pode trazer a confiança e a integridade para o que tem sido a súplica deles! Em áreas saturadas do Evangelho, a melhor coisa que nós podemos fazer é evitarmos completamente a ocupação de longo prazo e deixarmos os nacionais liderarem. Prepare-se: isto será debatido pelos missionários que tenham legitimidade e se sentem "em casa" no campo, e que são resistidos pelo Conselho da Missão que se gaba de ter "sua" presença em tantos países quanto possível. As palavras de Hudson Taylor moderam esta visão cultural popular. Ele disse, "eu vejo os missionários estrangeiros como um andaime em volta de um edifício em construção; quanto mais cedo puder ser dispensado, melhor". Glenn Schwartz, missionário veterano da África central que viu este perigo, escreveu em seu artigo do "Comportamento Missionário e a Síndrome da Dependência":

"Ocidentais frequentemente criam projetos, programas e instituições, que não podem ser continuadas ou reproduzidas por aqueles a quem estão tentando ajudar. Às vezes aqueles que criam essa dependência externa induzida traçam um futuro para eles próprios a partir do qual eles parecem que não poderão se libertar, se é que, de fato, eles desejam ser libertados. Se eles realmente não quiserem ser libertados, desenvolve-se uma conspiração a qual se apóia em criar a necessidade que é necessária para os de fora. A necessidade de ser necessário é uma força muito poderosa."

Nós não devemos estar satisfeitos com a ocupação de longo prazo em terras estrangeiras, uma vez que a retirada de nosso missionário-herói é necessária para um trabalho saudável junto ao nativo. A grande presença dos missionários estrangeiros é frequentemente a anulação do ministério local eficaz, uma vez que nós nos apresentamos continuamente como os "profissionais". Se os homens e as mulheres africanos podem controlar o Banco Barclays, linhas aéreas internacionais, lojas de departamento, e provedores de Internet, eles também não podem conduzir uma igreja, um instituto de treinamento, uma faculdade, um ministério no campo, ou uma missão liderada por países fronteiriços? Eu estou me tornando mais indignado, justamente, porquanto o povo de Deus acredita na propaganda alimentada pelos missionários que continuam a se promover como insubstituíveis. O problema real pode não ser uma falta de liderança local, mas de uma ambição pelo controle, enaltecimento, ou simplesmente uma falta de vontade de fazer uma transição do que se transformou em um confortável "paraíso ministerial" em uma terra estrangeira. Isso é o que os crentes locais estão começando a dizer, ainda que alguns desses, aqueles que recebem salários melhores provenientes de doadores das terras dos missionários estrangeiros, mantenham-se gravemente calados.

Esse "status de celebridade" que nós permitimos revela uma visão míope do que Deus está fazendo realmente no mundo. Os líderes cristãos necessários na África são marrons, não brancos. Eles falam línguas Bantu e Nilotic no coração, não apenas o inglês ou o francês ou o português. A melhor pessoa para pastorear a Zambia é um zambiano que fale Bemba, não um americano com um tradutor zambiano. A melhor pessoa para pastorear na República dos Camarões é um "camaroneano" que fale uma das línguas Afro-Asiáticas, da Nigéria-Congo, ou da região do Nilo-Sahara. A melhor pessoa para pastorear em Madagascar é um pregador nativo que não apenas aprendeu a cultura, mas respira, pensa, e é da cultura. Há poucas exceções a esta regra. Missionários do Cairo à cidade do Cabo estão estabelecendo pequenos reinos brancos – suas próprias marcas de cristianismo colonial. Estes impérios são construídos com apoio estrangeiro, donativos, criação de trabalho, e dominância sobre aqueles sob sua responsabilidade. Se nosso objetivo for estabelecer uma base operacional de longo prazo, então o trabalho está condenado a ficar boiando, para dar apenas uma aparência da vida, enquanto nós explodimos no gás hélio dos dólares dos Estados Unidos. Esse desfile deve parar. Nós temos que sustentar tenazmente a convicção de que os crentes locais são, eles mesmos, "capazes de instruir um ao outro" (Romanos 15:14; 2 Timóteo 2:2). Não se glorifica a Deus quando o status de celebridade é usado abusivamente para criar máquinas de angariar fundos que criam uma dependência destrutiva. Esta manipulação ministerial é raramente exposta, porque é encoberta por orações entusiasmadas, atualizadas com algumas fotos bem selecionadas. Os crentes nacionais começam a sentir insegurança com a falta de uma conexão direta ao "Sr. Missionário". O que causa esse pensamento? Uma pobre estratégia os ensinou, indiretamente, a acreditar que são incapazes de fazer o trabalho ministerial se desconectado do cordão umbilical de grandes doações de dólares. Desde que o agente canalizador para esse fluxo de recursos é o missionário, como pode o nacional realmente oferecer algum insumo significativo? Como pode discordar de um CEO investido de completo poder? Teria que ser um homem excepcional para discordar do Big Bwana quando o seu ticket refeição está em risco de ser confiscado.

Deve haver uma distinção entre o reino de Deus e o império dos homens. É sempre perigoso elevar homens, talentos, resultados, ou qualquer outra coisa boa se, em fazendo assim, nós espezinhamos a glória de Deus. Nós não somente dificultamos as missões, mas nós entristecemos o Espírito de Deus glorificando o homem, a igreja, o projeto, uma instituição, ou qualquer outra coisa acima de Deus. Nós temos tolerado demais uma fixação tola nos instrumentos e um olhar reverente par aqueles que devem ser servos. O vaso de barro não é o tesouro (2 Corinthians 4:7). Nós devemos avaliar se é a glória de Deus que nós estamos guardando zelosamente ou preservando a nossa própria agenda, preferências pessoais, ou a importância dos grandes presentes dados para construir edifícios. Somos nós passionais sobre as nossas marcas institucionais ou nós possuímos um zelo imparcial exclusivamente pela glória de Deus?

Ao deixarmos nossos queridos irmãos africanos fazer o trabalho em áreas saturadas, Deus pode dar a nós e a eles a sabedoria para saber como penetrar eficientemente nas linhas de frente, nas regiões de difícil acesso para a Sua glória. Enquanto a paisagem ministerial muda na África, Deus pode dar a homens e mulheres, evangelistas do Novo Testamento, sabedoria, ousadia, e a "aspiração de pregar o evangelho, aonde Cristo ainda não foi anunciado" (Romanos 15:20).

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